quarta-feira, 27 de março de 2013




Pernambuco cultiva mitos


Nós, os pernambucanos, pensamos alto. Amplificamos nossas idéias antes de colocá-las no papel e mesmo transpondo-as para as pranchetas, demoramos em transformá-las em pedra e cal. Somos especialistas em narrativas dos tempos fabulosos ou heróicos, ou melhor, exercitamos como ninguém a mitologia. Cultivamos heróis reais e exaltamos obras imaginárias.

Esse comportamento, amálgama da alma pernambucana, explica o desejo incontido de questionar concorrentes, adversários políticos e empreendedores. Essa postura do pernambucano reflete-se no imediatismo, na falta de planejamento e no culto às obras que, por ultrapassarem séculos, poderiam ser atribuídas a “Santa Engrácia”.

Transnordestina, Refinaria e Transposição. Três exemplos de “casos não-resolvidos” dos pernambucanos. Retratos de obras inacabadas e de projetos idealizados, mas arquivados nas prateleiras do inconsciente coletivo. Deixamos, por conta de um incêndio, de colecionar o quarto mito: o complexo portuário-industrial de Suape.

Há exatos 51 anos, época em que Pernambuco era governado por Etelvino Lins, o padre Louis Joseph Lebret elaborou, em parceria com técnicos locais, um diagnóstico e um prognóstico da economia estadual, estabelecendo, de forma pioneira no Brasil, a espacialização das atividades econômicas, com a criação, por exemplo, de cidades-pólo que barrariam o êxodo para o Recife. O dominicano francês considerava imprescindível um porto ao Sul do Recife, como forma de reverter o quadro de pobreza pernambucana. Ele não citava Suape, mas apontava para uma área que só poderia ser confluência dos rios Massangana, Tatuoca, Merepe e Ipojuca.


O trabalho, coordenado pela incipiente Comissão de Desenvolvimento de Pernambuco (Condepe), previa, num “plano a longo termo”, uma série de ações para “completar a infra-estrutura e implantar o equipamento de base, assegurar as indústrias de base e essenciais e promover a expansão das indústrias leves e de pesca”. Esse palavreado todo significava “o caminho das pedras dos pernambucanos”. Em outras palavras, era a receita para tirar Pernambuco do atraso social e econômico.


Passados quase 60 anos, agora é que nós, os pernambucanos, estamos transformando em pedra e cal as projeções do “Estudo sobre Desenvolvimento e Implantação de Indústrias, interessando a Pernambuco e ao Nordeste”, defendia três obras estruturadores (Transnordestina, Transposição e Refinaria); estabelecia a criação de fábricas de cimento, metalurgia, alumínio, mecânica, motores e veículos e química pesada; propunha investimentos na educação e, por último, preconizava a expansão das indústrias leves e de pesca.
         
Se levarmos em conta que os economistas consideram o longo prazo um período de 20 anos, as propostas deveriam estar, portanto, transformadas em pedra e cal antes da década de 80. Nada disso aconteceu.

Este texto, elaborado em 15 de setembro de 2005, mostra que, após oito anos, as obras estruturadoras ainda não foram concluídas.


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