
Por Andressa Anjos
Entre 1960 e 1980, no Cone Sul da América Latina, o cotidiano era marcado por assassinatos, seqüestros, torturas e desaparecimentos. Nos regimes das ditaduras civis e militares, brasileiros, argentinos, chilenos, paraguaios, uruguaios, que tinham opiniões divergentes a do governo, viviam sob a estética do terror, sendo reféns do medo, da violência e da perplexidade. Estavam todos submetidos à neurose da má notícia ininterrupta.
Escrito pelo jornalista Samarone Lima, o livro Clamor: A vitória de uma conspiração brasileira retrata a ação de um grupo – Clamor – que batalhou para denunciar e divulgar as violações dos direitos humanos ocorridas durante esse período de repressão, em que crimes hediondos eram cometidos com requintes de crueldade. Amparado na solidariedade, o Clamor “tinha a audácia e a leveza necessária para atravessar muros de prisões, levar palavras de apoio, esperança, luz onde havia escuridão” (p.149). Eliminando fronteiras geográficas, políticas, ideológicas, religiosas, sociais e econômicas, o grupo conseguiu chamar a atenção do mundo para uma realidade inimaginável: pais estavam sendo assassinados, e seus filhos, em muitos casos, eram adotados pelos próprios assassinos.
Apesar de saber que, nesse período de opressão, agressões físicas e atos desumanos eram cometidos com bastante freqüência, não havia pensado, por ingenuidade ou desinformação, que o ser humano fosse capaz de praticar atitudes tão cruéis com criaturas indefesas e inocentes. Dentre os fatos denunciados pelo Clamor e narrados por Samarone, os que mais me chocaram foram aqueles em que mulheres grávidas não escapavam da violência. Elas davam à luz na prisão, eram separadas dos seus bebês, imediatamente assassinadas e seus filhos eram traficados ou, pior, criados pelos assassinos de seus pais.
As ditaduras acabaram, mas deixaram feridas abertas que dificilmente cicatrizarão. Pessoas ainda são procuradas, parentes de vítimas ainda vivem com a esperança de um dia encontrar aqueles que sumiram, repentinamente, sem explicações. Apesar de, hoje, os participantes dos crimes ocorridos na ditadura estarem sendo julgados, não há punição capaz de superar traumas procedentes daquela época.
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