sexta-feira, 23 de novembro de 2007

QUAL É O VALOR DAS RECOMENDAÇÕES DA ONU?



* Alexandre Nápoles Filho e Rodrigo Deodato



O Gabinete de Assessoria Jurídica às Organizações Populares posta para o BlogMadrugador um paper sobre os resultados da visita a Pernambuco do Relator Especial da ONU sobre as Execuções Sumárias, Arbitrárias e Extrajudiciais, Philip Alston.


O paper destaca o fato de o Brasil compor com Colômbia, Siri Lanka e Suriname a lista de países revisitados pela Relatoria Especial da ONU, o que denota a falta de atenção desses governos em relação aos atentados aos direitos humanos.



"Passada uma semana da visita do Relator Especial da ONU sobre Execuções Sumárias, Arbitrárias e Extrajudiciais, o australiano Philip Alston, resta no ar um sentimento: será que uma pessoa que veio do outro lado do mundo, de regiões economicamente desenvolvidas e com realidades sociais bem distintas, terá condições de recomendar ações que de alguma forma minimize a complexa situação/estrutura das execuções sumárias no Brasil? E se conseguir, qual será o impacto real de suas recomendações?

Antes de refletir sobre isso, vale notar que não é a primeira vez que essa Relatoria vem ao Brasil para obter informações sobre a ocorrência de execuções sumárias e elaborar recomendações[1], a última foi em 2003, com a visita da paquistanesa Asma Jahangir. Tal fato de se repetir uma visita já se torna um acontecimento relevante, pois o Brasil, até o presente momento, é um dos poucos países a ser revisitado[2].

Com isso, aumenta ainda mais nossas inquietações, pois se o país já foi 'vistoriado' pela ONU em 2003, e no que aparenta é que nada ou pouco mudou, pois as ações truculentas de intervenção das policias e das organizações criminosas em geral junto às comunidades 'esquecidas' não demonstraram redução de suas atividades, então, o que garante que dessa vez a realidade seja diferente?

O Relator Philip Alston, em sua visita ao Brasil, de 4 a 14 de novembro, esteve diante de situações simbólicas e reais que demonstraram que a violência perpetrada principalmente pelos agentes estatais está longe de terminar. Primeiro, foi presenteado pelo comandante da PM do Rio de Janeiro com uma réplica do caveirão, símbolo da expressão equivocada de projeto de segurança publica. Depois, passou pelo constrangimento de não ser recebido pelo Governador do Rio de Janeiro, demonstração clara do desrespeito ao trabalho realizado pelas relatorias da ONU. Por fim, ao visitar Pernambuco, se deparou com duas rebeliões em centros de detenção, uma no Presídio Aníbal Bruno, outra na FUNDAC, o que acarretaram mortes e diversos feridos.

Assim, diante dessas pequenas demonstrações, presenciadas pelo Relator, do descaso das autoridades publicas ante a intervenção da Relatoria e da situação de violência que assola a sociedade brasileira, principalmente a pobre e negra, percebemos que ainda temos muito que caminhar para alcançar um ambiente favorável a proteção dos direitos humanos.

Como bem observa o Relator, o papel das Relatorias Especiais das Nações Unidas não é de substituir as investigações das autoridades brasileiras competentes, nem muito menos de condenar judicialmente os violadores de direitos humanos, mas suas intervenções servem como um importante instrumento de pressão internacional[3] para que o Estado invista em ações que de alguma forma respeite e promova os direitos humanos.

Entretanto, para que suas recomendações tenham a eficácia devida deve haver um empenho da sociedade civil e da mídia para pressionar, por meio de uma maior visibilidade às recomendações, as autoridades estatais na implementação das mesmas. Não se esquecendo, todavia, do papel ativo, ou melhor, da vontade política das diversas esferas do Poder (Legislativo, Executivo e Judiciário) na elaboração de iniciativas que possam ir além das recomendações prolatadas. Assim, as recomendações devem ser vistas não de forma taxativa e suficiente, mas sim como um norte a ser trilhado pelas autoridades estatais na busca da promoção e proteção aos direitos."




[1] Tais recomendações pouco foram implementadas pelo Estado brasileiro como analisa o próprio Relator Phlip Alston em seu follow-up das recomendações da Relatora Asma, produzido em 2006, do qual enaltece, em seu §79, que é altamente negativa a postura do Governo Brasileiro ante as recomendações. Para ter acesso ao documento ver: http://www.blogger.com/

[2] Desde o início dos trabalhos da Relatoria 25 países já foram visitados, o primeiro foi Suriname em 1984, mas somente ocorreu revisitação em quatro países: Suriname (1984 e 1987), Colômbia (1989 e 1994), Siri Lanka (1997 e 2005) e Brasil (2003 e 2005). Para mais informações ver o site: http://www.ohchr.org/english/issues/executions/visits.htm

[3] Vale lembrar que o Brasil é membro do Conselho de Direitos Humanos da ONU e que no próximo ano será alvo do monitoramento feito pela Revisão Periódica Universal desse órgão, que busca sondar o respeito do Estado aos Direitos Humanos. Além disso, não podemos esquecer que o Brasil é um dos sérios candidatos a um assento permanente no Conselho de Segurança, logo deve demonstrar respeito aos órgãos da Organização das Nações Unidas




• Alexandre e Rodrigo são estudantes de Direito e estagiários do programa dhINTERNACIONAL do GAJOP.


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