sábado, 17 de novembro de 2007

NEM OS SINOS SALVAM BELÉM DE MARIA

Se Belém de Maria fosse uma criança, ela estaria enquadrada na categoria "órfã". Na atualidade, ante a exclusão social, essa cidade da Mata Sul pernambucana está sendo abandonada por seus irmãos. No relatório final da Contagem da População do IBGE, feita em 5.435 municípios com até 170 mil habitantes e entregue ao Tribunal de Contas da União, Belém de Maria "perdeu" quase um terço de sua população. Dos 14.184 residentes em 2000, só restaram, agora, 10.140 pessoas. O município, que perdeu 28,51% de belenenses, não sabe mais por quem os sinos dobram.

Belém de Maria, mesmo rejeitada por parentes e aderentes, tem certidão de nascimento. Ela foi autenticada pelo jornalista Homero Fonseca, no livro Pernambucânia, ao recorrer ao IBGE: o registro de nascimento aponta como pai o município de Bonito. O nome surgiu de uma capela dedicada à Nossa Senhora das Dores por sugestão do frei Ibiapina.

Ao se transformar, em 31 de dezembro de 1959, em município, 89 dias após a eleição de Cid Sampaio, dono, à época, da Usina Roçadinho, Belém de Maria acreditava na capacidade de a agroindústria fazer o milagre da multiplicação dos pães. Nada disso aconteceu. As duas usinas – Roçadinho e Catende – passaram por dificuldades. Nas terras da Roçadinho, foi construída a fábrica Madeira Sintética que não prosperou. A usina terminou em Alagoas.

A Usina Catende segue sua via-crucis. Ainda hoje paga pelos pecados de má administração. Há dois meses e 12 dias, seus ex-trabalhadores fizeram um dia de protestos: ocuparam o Incra, foram ao Ministério Público do Trabalho, ao Tribunal de Justiça e ao Palácio do Campo das Princesas. Liderados pela Cooperativa Harmonia e com apoio da Fetape, entregaram ao Incra uma pauta de reivindicações. Entre os pleitos, a liberação de R$ 8,7 milhões para 4.300 famílias.

O dinheiro estava bloqueado na conta da cooperativa, aguardando apenas a assinatura do contrato de transferência das terras da Catende do Incra para os trabalhadores. Eles queriam ainda a desapropriação da usina, para poder processar a cana-de-açúcar, e a extinção do processo de falência da Catende, devido ao desinteresse dos antigos controladores em reassumir o patrimônio.

Num imbróglio desses, Belém de Maria não tinha nem tem como prosperar. As ações desenvolvidas pelos trabalhadores da antiga Usina Catende são válidas, mas não conseguem mudar a realidade da região nem alterar o quadro do município.
O perfil da Zona da Mata Sul, traçado pelo Condepe/Fidem, mostra a estagnação dessa Região de Desenvolvimento (RD), apesar de dispor de recursos hídricos, contar com um grande potencial turístico e iniciar um processo de diversificação econômica.

Caso a iniciativa privada e os poderes públicos – municipal, estadual e federal – não estabeleçam um planejamento para toda a região, a partir dos maciços investimentos em Suape, o quadro de miséria continuará.

É inconcebível que a Mata Sul detenha elevada taxa de mortalidade infantil; a segunda maior distorção idade-série no ensino fundamental; a maior taxa de abandono no ensino fundamental entre todas as regiões de desenvolvimento; o segundo maior déficit habitacional entre as outras RDs; precários sistemas de abastecimento d’água e esgotamento sanitário; ocupe o segundo lugar em taxa de homicídio para população total e não enfrente a prostituição infantil.

Belém de Maria é, por extensão, um reflexo desse quadro, tornado ainda mais dramático quando a Mata Sul enfrenta uma poluição hídrica (industrial e doméstica); debate-se com a erosão na área litorânea; usa o que resta da Mata Atlântica como fonte energética; pratica queimadas da cana-de-açúcar e usa de forma indiscriminada produtos agroquímicos. Para completar, não conseguiu, a exemplo da Mata Norte, criar alternativas reais, não paliativas, para a sazonalidade da atividade canavieira.

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